segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Um balanço de 2013 absolutamente nada faccioso


A cada final de ano eis que rotineiramente se fazem os devidos balanços. Muitas vezes facciosos. Sobretudo quando feitos por políticos. E começando por estes, e pela análise política, económica e social do nosso país, à esquerda ouviremos dizer que a situação deste piorou, encontrando-se num estado lastimável, como nunca antes visto. À direita ouviremos dizer que a situação do país está a melhorar, que se encontra em franco crescimento e que, por isso, o Éden está garantido. Ora nem mais! Já nem sequer me atrevo a pronunciar-me sobre os discursos do Primeiro-Ministro e do Presidente da República, dado terem tanto de hilariante como de enfadonho!
Se escutarmos os balanços feitos pelas estações televisivas nacionais, habitualmente apresentados à hora dos noticiários, veremos que no relato dos acontecimentos mais marcantes do ano estarão alguns protagonizados por elas próprias! Portanto, também aqui está presente o facciosismo!
Várias figuras públicas, à boleia dos média, aproveitam o momento, também para se promoverem. E o que isto? Exacto: facciosismo!
O menino Jesus…, não, esse não! Jorge Jesus dirá que 2013 foi mau para o Benfica devido ao minuto 91 ou 92. Se não fosse faccioso diria a verdade, ou seja, que ele já está há demasiado tempo no clube!
Para dar provas de que é possível fazer um balanço sério, honesto, realista de um ano que finda, decidi pôr mãos à obra, e dedicar-me a essa árdua, mas não menos nobre, tarefa de balancear. Sem facciosismos! Para tal, elegi algumas figuras, cuja projecção ultrapassa fronteiras, que servirão para relatar os acontecimentos mais importantes de 2013, alguns deles que seguramente terão mudado o rumo da História… que eu próprio continuo sem saber qual é!
Começando pela cultura, justiça seja feita ao destacar a exposição de pintura do artista plástico aguiarense, Rui Duarte, subordinada ao tema “Expressões corpóreas”, ocorrida em Abril, e que bateu todos os recordes de visita à galeria de exposições do Teatro de Vila Real. Um facto que certamente terá feito transbordar de inveja aquela miúda roliça, que dá pelo nome de Joana Vasconcelos!
A nível desportivo, destaque para a gloriosa conquista do Pisco, uma das mais belas montanhas dos Andes, pelo alpinista aguiarense Rui Duarte, em Agosto. Uma outra ficou por conquistar, o Huascarán, porque, segundo o próprio, “estava muito cansado”!
A nível político, o acontecimento que claramente mais marcou o ano de 2013, foi a manifestação promovida pela CGTP, a 20 de Outubro, que cruzou as margens do Douro pela ponte do Infante, que teve como protagonista, um dos seus mais fervorosos activistas e denunciadores das políticas de empobrecimento do país, o aguiarense Rui Duarte. À conversa com o próprio ficamos a saber que ainda houve tempo para a degustação das famosas “francesinhas”, numa das típicas tascas da baixa portuense!
Para terminar, e aproveitando a particular quadra espiritual que vivemos, no plano religioso o destaque vai para a peregrinação à Igreja da N. S. da Conceição, em Vila Pouca de Aguiar, no dia 25 de Dezembro, feita pelo devoto aguiarense Rui Duarte, na sua Suzuki Freewind.

domingo, 24 de novembro de 2013

As palavras de Mário Soares?! Violência?!

Cedo se apreçaram as Marias Amélias, quais virgens ofendidas, a sair à rua para condenar o Dr. Mário Soares, por (segunda as suas tendenciosas interpretações) o ex-presidente da República ter apelado à violência contra o governo, durante a sua intervenção na conferência "Em defesa da Constituição, da Democracia e do Estado social", decorrida na aula Magna da reitoria da Universidade de Lisboa, no passado dia 21.

NÃO, não é bem assim!

VIOLÊNCIA é um Primeiro-Ministro que convida os jovens, mão-de-obra qualificada, a emigrar;
VIOLÊNCIA são os comentários reaccionários e jactantes de figuras públicas como Fernando Ulrich, Camilo Lourenço, João César das Neves, entre outros;
VIOLÊNCIA são os cortes brutais, cada vez mais abaixo da média europeia, nos orçamentos para as artes, para a cultura, para a educação, para a saúde, para o desporto, para apoios sociais;
VIOLÊNCIA são os míseros 485€ do Salário Mínimo Nacional;
VIOLÊNCIA são reformas de 150, 200 ou 300€;
VIOLÊNCIA é o roubo nas pensões e nos vencimentos da administração pública;
VIOLÊNCIA são as remunerações faraónicas de alguns administradores;
VIOLÊNCIA é uma clientela político-partidária bem servida e remunerada que abunda nos gabinetes de ministros, à conta do erário público;
VIOLÊNCIA são as contínuas políticas que condenam cada vez mais o interior do país à desertificação;
VIOLÊNCIA são as rendas do sector das energias, o caso BPN, as PPP e outras traficâncias, sempre com os mesmos beneficiários, e os mesmos lesados;
VIOLÊNCIA é o empobrecimento do país;
VIOLÊNCIA é a subserviência aos agiotas e aos usuários que sugam o nosso país;
VIOLÊNCIA é a ignorância e a letargia (que se vêem reforçadas com actuais políticas educativas) de uma boa parte da população;
VIOLÊNCIA é o aumento de 2 milhões de euros no financiamento do ensino particular e cooperativo, em detrimento da escola pública;
VIOLÊNCIA é criar um sistema de “ensino dual” que visa criar uma escola de elites e outra para o “refugo”;
VIOLÊNCIA é a corrupção, o compadrio, o tráfico de influências, as fraudes que grassam entre políticos e grandes grupos económicos;
VIOLÊNCIA é a venda a retalho do país, digo, de empresas públicas com saldo positivo anual de milhões de euros, a multinacionais ou grandes grupos económicos, com sede fiscal noutros países;
VIOLÊNCIA são pessoas a faltarem a consultas médicas, a não comprarem medicamentos e bens de primeira necessidade, a não pagarem a renda ou a conta da luz, por falta de dinheiro.

SIM, isto tudo e muito mais é que é violência.



quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Propaganda e opinião pública


Tomei emprestado este título de uma obra de um dos maiores pensadores contemporâneos, o norte-americano Noam Chomsky. Trata-se de um livro que reúne um conjunto de entrevistas feitas pelo jornalista e escritor David Barsamian ao prestigiado linguista, filósofo e analista/activista político, ocorridas entre os anos de 1998 e 2000. Embora a primeira publicação tenha surgido em 2001, nos EUA, o seu conteúdo não deixa de ser actualíssimo, na medida em que muitos dos cenários políticos e sociais que Chomsky augurava para o mundo, já nessa altura, têm vindo a acontecer um pouco por todo o lado.
De entre os vários assuntos de eleição do autor, destacam-se os meios de comunicação, os direitos humanos e as relações internacionais. Chomsky é ainda um acérrimo defensor de uma cidadania democrática participativa e da valorização do capital humano. Como tal, sustenta que um cidadão não deve ser um mero espectador dos fenómenos sociais e dos acontecimentos políticos, mas sim manter um pensamento crítico e uma prática vigilante, sobretudo sobre as acções dos seus governantes. De uma maneira muito clara, objectiva e sustentada, Chomsky descreve os caminhos urdidos pelos políticos para chegarem ao poder e nele se perpetuarem. Fala-nos dos conluios com o poder económico, financeiro e com os meios de comunicação social, assim como com o FMI, a OMC, a OCDE, entre outros. Denuncia os abusos de poder e a forma como os governantes, juntamente com outros parceiros estratégicos, tudo fazem, incluindo por via legal, para manter os cidadãos na ignorância e afastados de decisões políticas, que poderão determinar um melhor ou um pior futuro das populações. Como faz saber Chomsky, o poder “entende a profunda importância de manter o público na ignorância, certificar-se de que não interfere, que determinada política será concebida e posta em prática pelos centros de poder autênticos sem controlo”[1]. Uma boa forma de o fazer é através da propaganda e da manipulação da opinião pública. Ora esta realidade logo me trouxe um exemplo à memória. Talvez pela sua proximidade, lembrei-me daquilo que vem acontecendo no nosso concelho há uns bons anos, ainda que na devida proporção e contexto social.
Ao longo dos 12 anos de governação autárquica laranja, agora a findar, os aguiarenses mais atentos, ou menos distraídos (depende da perspectiva), foram percebendo a forma como Dr. Domingos Dias foi capaz de construir e manter o seu feudo. A receita é simples, mas só está ao alcance dos mais engenhosos. Honra seja feita ao nosso presidente, que não só conseguiu colocar rédea curta à oposição interna, como foi capaz de aliciar alguns elementos da oposição externa, e ainda outros que teimam em fazer-se passar por offsiders. Uns favores aqui, umas mesadas ali, uns postos acolá, umas promessas além, enfim, tudo serviu para que alguns vendessem a alma ao diabo, mudassem de bandeira ou causa, e se alistassem na guarda pretoriana, que tão servilmente seguiu (e ainda segue) o nosso “imperador”. Simultaneamente, um programa de entretenimento foi animando a plebe, à boa maneira romana. A receita, portanto, deu os seus frutos. Logo, não vejo por que razão é que o seu discípulo e agora candidato à Câmara Municipal pelo PSD não seguiria a mesma receita, caso viesse a liderar os destinos do nosso concelho nos próximos anos! Aliás, nem é preciso evocar tal cenário. Na verdade, a cartilha do nosso presidente já há algum tempo começou a ser seguida. Só para dar um exemplo, veja-se o que se passou com a escolha de alguns dos elementos para formação da lista de candidatos à junta de freguesia de Bornes de Aguiar por este partido! Não sei se o facto do logótipo do PSD estar estampado nos panfletos e cartazes de propaganda para esta junta será suficiente para evitar que alguns eleitores, menos prudentes, sejam levados a pensar que se trata de uma segunda lista (ou uma lista de segunda linha) de socialistas!
Não se pode negar que o nosso presidente é um homem inteligente. Pena é que ao longo destes 12 anos de governação não tenha canalizado parte dessa inteligência para investir noutras áreas que, no meu entender, considero prioritárias para o nosso concelho e para os aguiarenses. Quando quer, também é um homem honesto. Recentemente, num artigo publicado no jornal A Voz de Trás-os-Montes, no dia 29 de Agosto, que se debruçava sobre os efeitos negativos do centralismo junto dos municípios da nossa região, o nosso presidente de câmara, embora reconhecendo, e muito bem, as perdas que essa política tem acarretado, desde há muito, para os municípios do interior, acabou, por outro lado, por admitir, e cito-o, que “O dinheiro tem sido mal gasto e os investimentos de milhões de euros no interior têm sido mal direccionados”. Ora bem, se não fosse a propaganda fervorosa do PSD que vem acontecendo nos últimos tempos, em especial as promessas feitas em público e as que vêm em desdobráveis e na imprensa dependente, que anunciam investimentos de milhões de euros em mais projectos megalómanos, demagógicos ou completamente desenquadrados do nosso contexto social, económico ou cultural, eu diria que o nosso presidente, com esse desabafo, acabou por fazer mea culpa do despesismo ocorrido ao longo das suas três legislaturas!
Para terminar, o ainda nosso presidente é um homem precavido. Decidiu não abandonar o trono, sem antes impor a inclusão de uma descendente na lista do PSD à câmara municipal. E logo para número dois! Embora não conheça pessoalmente a pessoa em causa, não deixa naturalmente de merecer todo o meu respeito, tal como qualquer outro candidato, seja de que partido for. Mas este facto tem tanto de caricato, como de suspeito. Diria mesmo que “leva água no bico”! Senão vejamos: depois do vice-presidente, agora candidato à câmara municipal pelo PSD, ter vivido, ao longo destes 12 anos, na sombra do seu superior (não sei se por descuido ou se por estratégia deste!), eis que agora o nosso presidente, através da sua filha, parece aspirar a conservar um pé dentro da autarquia, entenda-se, a manter algum poder ou influência nas políticas do município! Não imagino que isso fosse possível com outras figuras destacadas do partido, que há uns meses atrás foram apontadas como possíveis candidatos, ou candidatos a candidatos! Julgo mesmo que precisamente pelo facto do Dr. Domingos Dias ter tido consciência deste risco, é que os mesmos foram “apartados”!

[1] CHOMSKY, Noam (2002). Propaganda e Opinião Pública. Lisboa: Campo da Comunicação, p. 21.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Cartão Vermelho


Depois de uma derrota significativa do PS nas eleições autárquicas de Dezembro 2001, o então primeiro-ministro, o engenheiro António Guterres, apresentou a sua demissão. O desiderato por que tanto lutaram os partidos da oposição, da direita à esquerda, materializou-se. Durante a campanha para as ditas autárquicas, o PSD liderou o cortejo que pedia a cabeça do governo socialista, apelando, de forma eufórica e vociferada, ao cartão vermelho. E os portugueses assim responderam. Era então o líder do maior partido da oposição, o PSD, o doutor Durão Barroso, que à época se propunha retirar Portugal do “pântano”. Com a vitória do PSD nas legislativas, e com a coligação com o CDS-PP de Paulo Portas, deu-se então início ao XV Governo Institucional, agora chefiado por Durão Barroso. Tão preocupado ele estava com o estado do país, que logo na primeira oportunidade surgida, isto ao fim de pouco mais de dois anos de governação, abandonou-o em troca de uma cadeira mais cómoda, mais bem remunerada e, sobretudo, que lhe permitia aspirar a outras cadeiras de igual ou maior visibilidade. Estou naturalmente a falar do cargo de presidente da Comissão Europeia. Isto tem um nome: carreirismo político.
A conjuntura económica e social à época da demissão de António Guterres, ainda que evidenciando problemas sérios, nada, mas absolutamente nada se comparava à actual. Hoje, a demagogia, o cinismo, a corrupção, o conluio, a mentira, o despotismo, a arrogância, a falta de vergonha e o desprezo pelos mais necessitados tomaram conta do poder. O resultado é aquele que se sabe, mas sobretudo aquele que se sente, e de que maneira! Como protagonistas desta trama temos naturalmente alguns dos maiores grupos económicos, o sector financeiro, alguns comentadores encartados, e, claro está, o governo PSD/CDS, chefiado pela dupla Passos Coelho/Paulo Portas, com a ajuda dos seus preciosos conselheiros, e ainda com o alto patrocínio do Presidente da República!
Não perderei tempo com a campanha demagógica levada a cabo por Passos Coelho para as legislativas de 2011, da qual saiu vencedor. Basta lembrar que não só não cumpriu o que prometeu, como acabou por fazer aquilo que disse que jamais faria. À austeridade imposta pela troika, o governo de Passos Coelho e Paulo Portas acrescentou, de forma voluntarista, mais uma boa dose de austeridade, sustentada numa deriva ideológica e subjugada pela ditadura financeira.
Ao fim de pouco mais de dois anos de governação PSD/CDS os resultados estão à vista de todos: aumento de impostos para quem trabalha, investe e consome; falências e consequente despedimento de milhares de trabalhadores; cancelamento de dezenas de milhares de contratos com funcionários sem vínculo ao Estado; mudança das regras do subsídio de desemprego e diminuição dos apoios sociais; convite (e com sucesso!) aos jovens mais qualificados a emigrar, deitando ao lixo o dinheiro dos nossos impostos que foi investido na sua formação; queda do PIB; aumento do número dos que não podem pagar os seus empréstimos bancários dispara; aumento do número de subsídios de desemprego (cada vez mais reduzidos); aumento da idade da reforma; cortes sucessivos nas pensões. Entretanto, o Estado não consegue pagar a dívida, nem os respectivos juros, e o défice não desce para os níveis pretendidos. Logo, é anunciada a revisão em baixa das tabelas salariais da administração pública, decretado o aumento do horário de trabalho dos funcionários públicos para as 40 horas semanais, anunciado um programa de rescisões/despedimentos que se perspectiva que venha a atingir cerca de 30 mil trabalhadores do Estado, e ainda um novo corte de 10% nos encargos dos ministérios que, como é óbvio, irá concentrar-se na Educação, na Segurança Social e na Saúde.
O governo PSD/CDS tentou ludibriar os portugueses ao anunciar que atacaria as despesas funestas com as PPP, que acabaria com o problema das rendas excessivas na energia, que reduziria substancialmente nas despesas dos ministérios, etc., mas acabaram por se virar para a receita do costume: impostos, taxas, leis que permitam mais despedimentos na função pública, assim como um ataque sistemático às pensões dos reformados, com os aposentados do Estado a serem moralmente acusados de "privilegiados" em relação ao sector privado, para ver se, sob tal suspeição, aceitam pacificamente o roubo de que serão sujeitos. Entretanto, o país vai sendo vendido a retalho a chineses, angolanos, entre outros.
Na falta de humildade para reconhecer o fracasso das suas políticas, o primeiro-ministro, seguido de membros do seu partido e dos tais comentadores encartados, prefere eleger o Tribunal Constitucional como bode expiatório, acusando-o de falta de bom senso na interpretação da lei maior, a Constituição da República Portuguesa. É caso para lembrar o que há poucos dias escrevera Baptista Bastos, Quando está no poder, o PSD manifesta muita dificuldade em relacionar-se com as instituições que representam a democracia”.[1]
Depois de todo este quadro negro aqui lembrado, o primeiro-ministro ainda tem o descaramento de dizer em voz grossa, aliás, de garantir que irá prosseguir o mesmo caminho, ou seja, o do empobrecimento do país e dos portugueses. Um caminho, cujo mais recente relatório (cínico) do FMI, sobre as políticas de austeridade que estão a ser aplicadas no nosso país, alerta para o facto de que um ajustamento muito grande, num curto espaço de tempo, pode conduzir a um aumento, em vez de uma diminuição, da dívida e dos custos dos empréstimos. As mesmas políticas são criticadas pela Oxfam, uma organização não-governamental que luta contra a pobreza, e que no seu último relatório alerta para os riscos de Portugal tornar-se num dos países mais desiguais do mundo se a política de austeridade prosseguir. A directora do ramo europeu da Oxfam, Natalia Alonso, criticou o recuo dos direitos sociais, os cortes radicais nos orçamentos da segurança social, da saúde e da educação, a redução dos direitos dos trabalhadores e ainda uma fiscalidade injusta.
Salvo raras, mas tímidas excepções, os autarcas laranjas têm estado muito silenciosos quanto às políticas desastrosas e criminosas do governo de Passos Coelho/Paulo Portas. Não se houve nenhuma crítica! Parecem estar de acordo. Como diz o povo “quem cala, consente”! Mas se realmente quisermos pôr cobro a esta sangria, chegou o momento do povo gritar BASTA! Como alertava há alguns meses atrás Nuno Saraiva, “O tempo é, pois, de dizer basta. Basta da desonestidade de afirmar que não há alternativas. Basta da falácia repetida vezes sem conta sob a forma de discurso único de que "renegociar o ajustamento" é sinónimo de não querer pagar a nossa dívida. Basta de nos enganarem sistematicamente com a promessa de que "os sacrifícios valerão certamente a pena". Basta de nos fazerem de idiotas garantindo que "não haverá mais aumento de impostos (…)".[2]
Posto isto, estas eleições autárquicas representam um momento único e imperdível para dar um CARTÃO VERMELHO ao GOVERNO, mas com umas características especiais. Qualquer coisa como um cartão vermelho fluorescente, do tamanho da área geográfica de Portugal.



[1] Diário de Notícias, 04-09-2013.
[2] Diário de Notícias, 04/05/2013.

domingo, 18 de agosto de 2013

Expedição aos Andes


No passado dia 5 de Agosto atingi o cume de uma das montanhas da Cordilheira dos Andes, no Peru. Tratou-se do Pisco, uma montanha a 5752 metros de altitude. Situada na chamada Cordilheira Branca, esta montanha assume uma posição central, uma vez que se vê rodeada de várias e impressionantes montanhas, cuja beleza e grandiosidade são indescritíveis.
O ataque ao cume, que foi feito juntamente com outros dois companheiros, o peruano Edgar e o russo-peruano Evgueni, iniciou-se às 3 horas da madrugada, do campo 1, a 4900 metros, tendo levado cerca de 6 horas para atingir o topo da montanha. O desnível foi de 852 metros, feito por um percurso sinuoso, que cruzou alguns glaciares e vertentes escarpadas. A cerca de meia hora do cume fomos atingidos por fortes rajadas de vento e alguma neve, que no entanto não foram suficientes para demover-nos do nosso propósito. Nesse preciso momento as temperaturas atingiam os 17 graus negativos!

O feito foi muito custoso, mas que valeu a pena pelas paisagens que pudemos saborear, assim que chegámos ao cume. Essas e outras paisagens podem ser visionadas através do link de um vídeo, que eu próprio produzi, e que deixo ao cuidado dos leitores mais interessados: http://youtu.be/80RqOKI7Rz4

Tentei ainda uma segunda montanha, o Huascarán Sul, a maior da Cordilheira Branca, com os seus 6768 metros, mas o cansaço acumulado, ao qual não estão alheias algumas noites mal dormidas, acrescido da queda de um nevão no dia/noite de ataque ao cume, não me deram forças suficientes para culminá-la. Fiquei-me pelos 6200 metros. No entanto, não deixou de ser uma experiência que se traduziu em aprendizagens, desde logo uma muito importante: saber desistir.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Via Spartacus


Depois de há precisamente um ano atrás ter equipado e aberto, em solitário, uma via de escalada com 120 metros de recorrido, cotada em 6c+, no coração do Marão, que baptizei de Mirabilia Regnum (“Reino Maravilhoso”), voltei ao local para, uma vez mais, deitar mãos à obra e abrir uma nova via. Na verdade, trata-se de uma variante com 40 metros, que desemboca na via anterior, agora criando uma linha mais ou menos recta, que perfaz um total aproximado de 110 metros (7c+?/A1+). Também esta via, que baptizei de Spartacus, foi equipada e aberta em solitário. O passo mais duro fi-lo em artificial, tendo recorrido a estribos. E mesmo aqui a exigência física é muita! Ainda que nunca tenha feito uma via de nível 7c, a minha estimativa não deve estar longe da realidade, pois já consegui ir até 7ª+/7b. Não descarto a hipótese de poder ter uma cotação ligeiramente superior, mas não me parece!
Na imagem, a via aberta no ano passado está marcada a vermelho, e a que acaba de ser inaugurada, a branco.
Deixo aqui o link de acesso a um vídeo da abertura/escalada da via Spartacus, que eu próprio produzi: http://youtu.be/FHckD8r6hfM.
Para os escaladores interessados, a informação necessária sobre os seus acessos e a sua descrição encontra-se em: http://educator-mons.blogspot.pt/2012/08/mirabilia-regnum_6.html




domingo, 21 de julho de 2013

Ainda sobre escolhas… e o compromisso de “salvação do memorando”

Não imaginava que a recente crise política, criada no seio do governo, me fizesse voltar a tocar num tema que recentemente explorei num artigo, publicado no número anterior deste jornal. Recordo aqui que o iniciava da seguinte forma: “Será uma vulgaridade dizer que um qualquer órgão executivo deverá primar pela competência e pela seriedade. Logo, a primeira premissa a considerar deveria ser a ponderada escolha dos elementos para a sua formação”. Embora estendendo esta conclusão a qualquer tipo de executivo, confesso que o contexto que nessa altura tomei como referência foi aquele que melhor conheço, ou seja, o órgão de gestão de uma escola ou agrupamento de escolas. Inspirou-me particularmente um, cuja sua recente extinção foi um verdadeiro serviço público. Falo de um órgão de gestão ferido logo à nascença, precisamente pelo esvaído perfil dos elementos que o constituíram. Mais faziam lembrar algumas figuras de um infausto presépio, nomeadamente, o menino Jesus, a Maria e o burro! Ou então, e numa versão mais erudita, um conto resultante de uma mescla de Maquiavel, Kafka e Edgar Poe! Enfim, falo de uma brigada cujo desempenho foi de tal modo lastimoso, que seria penoso descrevê-lo aqui.
Voltando ao governo da república, na verdade, o espectáculo deplorável que temos vindo a assistir, iniciado com a demissão do Dr. Vítor Gaspar no início deste mês (que se despediu com uma carta, que mais não representou do que um atestado de incompetência passado ao actual governo… e a si próprio!), seguida da “irrevogável” demissão do Dr. Paulo Portas (apenas por uns escassos dias!), ilustra bem as consequências de uma má escolha dos elementos para a constituição de um executivo, a começar pelo seu líder. Como eu dissera no referido artigo, “falhar neste ponto é um passo decisivo em direcção à tortuosidade e ao mais que provável descontrolo da governação, com todas as consequências nefastas que daí possam advir”. E que temos nós vindo a assistir?!
Poderia elencar um conjunto de elementos do governo, a começar pelo primeiro-ministro, que ilustram bem alguns casos de impreparação, incompetência, oportunismo, irresponsabilidade ou desonestidade. Veja-se, a título de exemplo, um caso ainda fresco, passado como o ministro da educação, que depois de um acordo recentemente celebrado com os sindicatos de professores, acabou por publicar em Diário da República, no passado dia 10 de Julho, legislação que contraria algumas das medidas que tinham ficado definidas nas reuniões negociais. Ou seja, deu o dito pelo não dito! Que é isto senão um exemplo de desonestidade, para além de cretinice?
Em síntese, o “circo político” a que assistimos, para além de revelar uma falta de sentido de Estado e de compromisso para com os portugueses, ilustra bem uma determinada estirpe de políticos que nos governa, mais preocupados em gerir as cadeiras do poder, do que a tentar retirar o país do atoleiro em que se encontra!
Quanto ao Presidente da República, bom, deixou-me baralhado! Se há uns meses atrás escrevia a criticar o seu silêncio ensurdecedor ou a sua inacção perante o rumo preocupante que o país vinha (e vem) seguindo, agora, e com a sua intervenção nesta novela política protagonizada por actores de terceira categoria, numa tentativa de ressuscitar um “nado-morto”, reconheço que o melhor mesmo é voltar para o seu retiro. Querer que se crie aquilo que designou de “compromisso de salvação nacional”, excluindo logo à partida alguns dos partidos com assento parlamentar, que representam, no seu conjunto, centenas de milhares de portugueses, revela, desde logo, um défice democrático. Ao ignorar as fracturas entre o governo e o Partido Socialista, tentando vincular (ardilosamente) este, não ao dito compromisso, mas à salvação do memorando da troika, mais não vez do que prolongar a crise política. Como bem sintetiza Manuel Maria Carrilho, “O que de modo nenhum o Presidente da República podia fazer era chamar compromisso de salvação nacional a uma proposta de mera salvação de um memorando cuja execução nos trouxe aqui, pela mão do agora arrependido Vítor Gaspar. O que de modo nenhum o Presidente da República podia fazer era fixar um calendário eleitoral que, associado ao tal compromisso de salvação nacional, condicionaria a discussão e as opções do povo português aos limites de uma tutela degradante para a democracia.” (DN, 18/07/2013).
Como de certa forma já era espectável, as reuniões tripartidas entre PSD, CDS e o PS não deram em nada. A “grande alternativa” apresentada pelo Presidente da República foi a de, surpresa das surpresas, manter o actual governo em funções!
Acabámos por voltar ao ponto de partida: o problema da escolha irreflectida de protagonistas para a formação de um executivo e, consequentemente, de políticas!

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Escolhas Acertadas vs. Fatídicas


Será uma vulgaridade dizer que um qualquer órgão executivo deverá primar pela competência e pela seriedade. Logo, a primeira premissa a considerar deveria ser a ponderada escolha dos elementos para a sua formação. Este postulado aplica-se, naturalmente, nos mais variados contextos em que tal possa verificar-se, quer se trate do governo de uma república, de uma autarquia, de uma associação cultural ou mesmo de uma escola. Falhar neste ponto é um passo decisivo em direcção à tortuosidade e ao mais que provável descontrolo da governação, com todas as consequências nefastas que daí possam advir. Veja-se o exemplo da actual coligação PSD/CDS. Tirando os casos em estado vegetativo que ainda lá moram, nunca é demais lembrar o imbróglio que representou para a coligação o Dr.(?) Miguel Relvas, no (demasiado) longo período de tempo em que foi ministro. Passos Coelho, ao manter a confiança (!) no seu ‘promotor’, mais não fez do que lhe prolongar a sua agonia, ao mesmo tempo que infligia rudes golpes na credibilidade do seu próprio governo.
Infelizmente existem por aí muitos “miguéis relvas”! Podemos encontrá-los nas redondezas, e com histórias muito semelhantes à do ex-ministro. Não é de todo difícil encontrar figuras que, por exemplo, forjaram credenciais para poderem progredir numa carreira política ou profissional. Só que, malogradamente, se não for um outro elemento da mesma equipa a “tirar o tapete” ao prevaricador, poderá ser, então, um qualquer diploma legal que venha a fazer ou a repor justiça. Estas figuras, melhor dizendo, figurantes, por vezes de aparência claramente condizente com a sua essência, não passam de seres que, isolada ou cumulativamente, revelam características singulares. Vão desde os complexados, frustrados, enjeitados ou presunçosos, até aos parasitas, cobardes, sinistros ou simplesmente bacocos. Em síntese, falamos da fina for da incompetência!
Há ainda que contar com os conselheiros, verdadeiros “salta-pocinhas”, sempre à espera da sua oportunidade para tirar dividendos próprios. Personagens tão depressa mal-amadas e/ou perseguidas, como de repente (pasme-se!), verdadeiros parceiros estratégicos, por exemplo, nas cruzadas contra os ‘infiéis’ que ousam legitimamente enfrentar o despotismo e a baixeza dos que detêm o poder. Esses, porque vivem em Estados párias, pouco ou nada lhes importa quem os atiça ou sustenta. Nada dados a escrúpulos, este tipo de criatura não hesita perante a oportunidade de assaltar ela própria o poder, mesmo que o seu passado, enquanto ‘governante’, esteja marcado por uma acção calamitosa. Mais do que para servir, estão para servir-se!
Uma primeira ilação que se poderá, desde logo, retirar, é que aquele que tem a responsabilidade de formar um executivo, lato sensu, deverá estar bem consciente das escolhas que irá fazer para a sua composição, entenda-se, que ministros, secretários, vereadores, assessores, ‘subs’ ou adjuntos irá nomear. Deverá ponderar bem no momento de escolher. Mas mais importante ainda, é um presidente, primeiro-ministro ou director de qualquer instituição ter clarividência quanto às suas capacidades de liderança e quanto à sua missão. Quem falhar aqui, seguramente que, mais cedo ou mais tarde, falhará no resto. E mais pagará, quanto mais obstinado for.
Distinguiria dois tipos de “homem do leme”: a) aquele que tem um projecto de direcção/governação assente nos mais nobres valores, e numa razoável dose de altruísmo; b) aquele que visa tão-somente, ou acima de tudo, atingir um status que lhe permita notoriedade, e quem sabe fazer da cadeira do poder um trampolim para voos mais altos, eventualmente mais rentáveis.
O primeiro orientará a sua acção através da seriedade, humildade, diálogo, respeito pelos seus pares, valorização dos recursos humanos de que dispõe, mais os que for capaz de convocar, num projecto realista e agregador, capaz de reunir as sinergias necessárias para a sua efectivação.
O segundo privilegiará, primeiro, os seus interesses particulares, seguido os dos seus ‘cúmplices’, e só depois os que primeiro deveria servir. Para o efeito contará com oportunismos, encenações, diplomacia travestida e ainda com o alto patrocínio de alguma imprensa. Como resultado, teremos um “governante” e um executivo de face "caiada", cujo exercício fica marcado, por um lado, pela inércia, conflitualidade, perfídia, cobardia e futilidade, e por outro, pelo culto da personalidade, “caça às bruxas” e subserviência a interesses político-partidários. Acontece que os desta segunda linhagem, porventura mais cedo do que pensavam, ou do que as profecias anunciavam, acabam um dia por sair pela porta das traseiras… sem glória, nem saudade!

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Um lugar garantido na História


Independentemente da roda livre em que se encontra o governo, com saídas e entradas de ministros e secretários de Estado, fazendo lembrar a natural azáfama que resulta da limpeza apressada de uma casa que se quer asseada para receber convidados especiais (!), não posso deixar de reconhecer, como manda o bom senso, que o actual elenco governativo tem, como todos os anteriores, ministros de idoneidade inquestionável. Todavia, os poucos que se aproveitam, apesar das suas boas intenções, da sua visão estratégica, espírito de iniciativa, capacidade de trabalho e honestidade, certo é que estão fortemente condicionados na sua acção por quem realmente manda: o ministro das Finanças/troika. Mas há um deles que rola em contra-círculo, que se destaca precisamente pelo seu incansável voluntarismo para aplicar medidas de austeridade, pois a coberto delas encontra mais uma oportunidade para continuar a pôr em prática a sua tão desejada agenda ideológica. Refiro-me, precisamente, ao ministro da Educação. Nuno Crato, munido de toda a sua “artilharia pesada”, tudo tem feito e tudo continuará a fazer para prosseguir, de forma entusiástica, a sua grande ofensiva contra o Estado social, na parte que lhe toca. Entenda-se, contra a Educação e a escola pública.
Ora passemos em revista, e de forma telegráfica, as grandes medidas revolucionárias no sistema educativo português levadas a cabo pelo visionário ministro da Educação: aumento do número de alunos por turma; descaracterização curricular, na qual se inclui a eliminação de disciplinas imprescindíveis; alargamento dos exames para os 4º e 6º anos de escolaridade (contrariando o que se verifica na generalidade dos países da UE); redução progressiva da autonomia das escolas; diminuição contínua de verbas para projectos e para a investigação; desmantelamento da escola inclusiva; cortes orçamentais e desinvestimento em Educação; congelamento da carreira docente e salários desvalorizados; aumento efectivo da carga lectiva docente; criação dos descaracterizados e pedagogicamente ingeríveis mega-agrupamentos; despedimentos em massa de professores; desinvestimento na educação de adultos…
Mais recentemente, em mais um dos seus experimentalismos irreflectidos, o ministro da Educação revogou o programa de matemática em vigor para o Ensino Básico. Para Lurdes Figueiral, presidente da Associação dos Professores de Matemática, esta decisão “é um tremendo erro e um desperdício de investimento de meios económicos e de trabalho desenvolvido pelos professores”, bem como, “um retrocesso na aprendizagem dos alunos e um desrespeito pelo trabalho dos professores”. A associação defende o actual programa de matemática porque, diz a sua representante, “baseia-se em princípios defendidos pela investigação internacional e tem pontos em comum com países como a Finlândia e Singapura, que têm as notas mais elevadas”.
Na calha está a imposição precoce de vias de ensino profissional e vocacional, o tal “ensino dual” defendido por Nuno Crato, seguido apenas em três países europeus (Alemanha, Áustria e cantão alemão da Suiça). Na Alemanha este modelo ainda não foi abolido nos estados que ainda o seguem, devido a uma forte resistência por parte de uma maioria conservadora, tal como o afirma Barbara Geier. Esta professora e sindicalista alemã, apontando os defeitos e as consequências negativas deste modelo, defende as virtudes de uma escola unificada.
Por todas estas medidas e políticas ultraliberais e neoconservadoras tomadas, mais as que se perspectivam, e independentemente do seu tempo de permanência no governo, não restarão dúvidas de que Nuno Crato terá já garantido um lugar na História do Portugal democrático, como o pior ministro da Educação.
O mais recente relatório do Conselho Nacional de Educação (CNE), intitulado “Estado da Educação 2012”, dá conta de algumas das preocupações deste órgão consultivo face a algumas das políticas educativas que têm sido implementadas por este governo. Os cortes orçamentais e o desinvestimento na Educação levam o CNE a recear um retrocesso no sector, o que, segundo a sua presidente, isso seria “catastrófico”. Nas suas recomendações, o CNE chama a atenção para que, “Num quadro de escassez de recursos, é fundamental a percepção política de que partimos de um patamar de escolarização da população muito inferior ao dos nossos parceiros europeus e que, tendo iniciado uma recuperação significativa dos níveis de qualificação de jovens e adultos, rapidamente regrediremos”. Naturalmente que este relatório, tal como os anteriores, terá um destino certo para o ministro da Educação, ou seja, a gaveta! Basta ver a forma como se apressa a contrariar, com todo o desplante, cinismo e com um deficiente conhecimento empírico, as conclusões de uma equipa de trabalho que, ao contrário dele, é composta por verdadeiros profissionais da educação, entenda-se, professores e investigadores com uma larga experiência nos mais diversos níveis e graus de ensino, e na investigação em Educação, e que por isso conhecem bem a realidade educativa do nosso país. Para estes, tal como muitos outros que não se deixam levar pelo “canto das sereias”, as raras intervenções públicas do ministro da Educação têm tanto de confrangedor como de gritante, por não deixarem de revelar não só a sua ignorância relativa a uma série de matérias sobre educação, como também o seu “ódio de estimação” pela Pedagogia, apesar da sua tentativa em dissimulá-lo, através da sua habitual e trabalhada voz cândida e do seu sorriso leve.
Quem conhece bem Nuno Crato, sabe bem das suas ideias primitivas, retrógradas e reaccionárias, desajustadas no tempo e no espaço, marcadas por uma série de preconceitos quanto à profissão docente, ao saber pedagógico e às Ciências da Educação, sendo defensor de um paradigma que censura a escola inclusiva, democrática e participativa.
Quem não anda de olhos vendados, ou quem não olha apenas para a sua “despensa”, sabe bem das perigosas intenções de Nuno Crato, sendo a mais preocupante de todas, a preparação do terreno para a privatização da escola pública. Também sabe que o pensamento “cratiano” vai beber às teorias especulativas e mercantilistas da economia (sua formação de base!), que têm como grandes “pedagogos” nomes como, por exemplo, os de Adam Smith, Friedrich Hayek ou Benjamin Constant, figuras defensoras do mercado livre, capaz de se auto-regular, e do Estado mínimo. Então não foi Nuno Crato que disse publicamente, num passado muito recente, ainda não era ele ministro, que por ele implodia o ministério da Educação? Pois é!

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Oposição de esquerda

No passado dia 10 de Abril, na estreia de um espaço semanal de opinião na TVI24, Manuela Ferreira Leite, essa arrojada figura de esquerda, considerou o chumbo do Tribunal Constitucional (TC) a algumas das medidas do Orçamento de Estado para 2013, como a saída da sorte grande ao Governo. A ex-líder do PSD e antiga ministra das Finanças, queria, com isto, dizer que esse facto constituía uma boa oportunidade para a dupla Passos & Gaspar mudar de rumo. No entanto, Ferreira Leite, logo reconheceu que se equivocara, e que o governo estava firme e determinado na prossecução das suas políticas de austeridade, apesar dos indicadores negativos registados nas diversas frentes da sua actividade governativa.
Ferreira Leite acusou o Governo de entrar num jogo (inconsequente) de dramatização e teatralização sobre as decisões do Tribunal Constitucional, admitindo que os cortes anunciados por aquele “não vão ser cumpridos, nem são exequíveis”, e que o país está a entrar “numa fase de privação, abaixo da pobreza, em que as pessoas já não se conseguem alimentar”. De certa forma, Ferreira Leite condena a política de terra queimada que está a ser levada a cabo, quando sublinha que “não se consegue refazer um país a partir das cinzas”. A militante social-democrata, no seguimento da sua crítica cerrada ao Executivo, evoca a matriz ideológica do seu partido, para lembrar que este “sempre colocou em primeiro lugar o primado da pessoa”. Sem pôr em causa a sua fé e a sua seriedade, parece-me que Manuela Ferreira Leite está um pouco deslocada no tempo, ou então anda distraída, pois há muito que o seu partido mudou de paradigma!
De entre outras ilustres figuras de esquerda que se têm entretido a zurzir no Governo, uns com maior contundência do que outros, como Marques Mendes, Morais Sarmento, António Capucho, Marcelo Rebelo de Sousa ou Pires de Lima, Pacheco Pereira tem claramente liderado o pelotão, mantendo a camisola amarela ao fim de várias etapas do “Giro” português. No passado dia 9, no programa Quadratura do Círculo, da SIC Notícias, Pacheco Pereira afirmou que o Governo “entrou numa guerra institucional dentro do Estado, em colaboração com a troika, para abrir caminho a políticas de duvidosa legalidade e legitimidade baseadas no relatório que fez em conjunto com o FMI”. O mesmo estende-se nos seus comentários, ao pedir a demissão do governo, por entender que não conhece “nenhum motivo mais forte e justificado para a dissolução da Assembleia da República por parte do Presidente do que este acto revanchista contra os portugueses”. Na verdade, Passos Coelho, após o chumbo do TC, cedo se apressou a bramir e a ameaçar com medidas alternativas para colmatar o “buraco” de cerca de 1,300 milhões de euros, resultante da decisão daquele órgão supervisor. Logo reuniu com a sua equipa ministerial e, de facas e cutelos afiados, começaram agendar o esquartejamento que se espera nas áreas da segurança social, saúde e educação.
A propósito de troika, nas reuniões do Eurogrupo e Ecofin ocorridas entre os dias 11 e 13 deste mês, em Dublin, na Irlanda, uma vez mais podemos constatar o servilismo deplorável que o nosso ministro das Finanças continua a manifestar perante os nossos credores. Perdeu uma boa oportunidade para se juntar aos seus colegas irlandeses, que aproveitaram a “boleia” de um ex-responsável do Fundo Monetário Internacional (FMI), Ashoka Mody, que criticara a receita da austeridade. Vítor Gaspar não tardou a ser alvo de uma crítica sarcástica por parte de jornalistas irlandeses, ao ser apelidado de “ministro da troika”, por não defender os interesses de Portugal, mas, sim, as do triunvirato. O caso aconteceu num noticiário do canal irlandês RTE, no qual dois jornalistas revelaram a sua estupefacção pelo facto do nosso ministro da Finanças não criticar a austeridade, mas, sim, defender as suas virtudes! Só que desta vez, de nada lhe valeu andar de bandeja na mão e sorriso de orelha a orelha, no costumeiro comportamento bajulador, pois não granjeou qualquer elogio pelas medidas governativas que tem tomado e que defende de forma dogmática!

terça-feira, 19 de março de 2013

Do silêncio de Cavaco ao som da Grândola


Os diagnósticos sobre a actualidade política, económica e social do nosso país têm saído quase ao ritmo de pãezinhos quentes. Vindos dos mais diversos quadrantes políticos, de especialistas, analistas, comentadores, de diversas entidades ou instituições nacionais e internacionais, certo é que esses diagnósticos acabam, com mais ou menos apêndices, por ser convergentes num ponto: Portugal tornou-se num país empobrecido e pouco auspicioso.
Por haver gente bem mais versada do que eu para fazer diagnósticos do género, prefiro debruçar-me sobre outras questões, que no meu entender, e pela sua pertinência, merecem uma breve reflexão crítica. Mas antes, devo lembrar que o estado a que o país chegou não é culpa de um, mas de vários governos. Os do professor Cavaco Silva, por exemplo, foram os primeiros a lançarem-se em obras megalómanas, no despesismo de fundos europeus e em fraudes e na má gestão de dinheiros públicos.
Habituámo-nos a ver que o governo que chega a S. Bento, logo se apressa a culpabilizar o anterior, começando por bradar aos céus pelo estado em que encontrou as finanças públicas. Do passado há que retirar ilações dos erros cometidos, alguns deles anacrónicos, para que não se voltem a repetir no futuro, embora, e por razões culturais, não vislumbre uma mudança significativa a este nível!
Sobre o presente, bem, podemos começar pela mais recente manifestação nacional, verificada no passado dia 2 de Março. Uma vez mais, o povo, dos mais diversos extractos sociais e simpatias partidárias ou apartidários, voltou a sair à rua, mostrando, por um lado, um cartão vermelho ao governo de Passos Coelho, manifestando-se contra as políticas de austeridade que este tem implementado com a bitola da troika, e que têm conduzido o país para um terreno pantanoso, e assim ao risco de uma conflitualidade e fragmentação social; por outro, um descontentamento contra a classe política em geral, onde se incluem, obviamente, todos os partidos. O PS, um dos partidos do chamado arco do poder, se realmente quer apresentar-se como alternativa credível para governar o nosso país, se quer conquistar a confiança dos portugueses, então ainda tem muito trabalho de casa a fazer.
Se do governo apoiado pela coligação de direita PSD/CDS não se descortina uma inversão nas suas políticas desastrosas, impunha-se, pelo menos, que por parte do mais alto magistrado da nação surgisse uma posição clarificadora sobre o perigoso rumo que o país está a tomar. Sobre os brutais sacrifícios que têm sido impostos, em vão, aos portugueses, sobre o empobrecimento das famílias, sobre a forma leviana com que o Ministro das Finanças sistematicamente corrige as previsões económicas, sobre a subserviência de Passos Coelho e Vítor Gaspar à troika, do Presidente da República, também um dos visados na referida manifestação nacional, não vimos mais do que uma mão cheia de nada. Sobre o desemprego galopante, a contracção da economia, o elevado número de falências que se registam diariamente, ou o corte abusivo nos salários e pensões, apenas se registaram umas tímidas declarações de circunstância, alguns chavões, que surgiram apenas porque cruzou pelos jornalistas, como aconteceu no passado dia 6. Lastimosamente, Cavaco Silva, esquivando-se a questões “incómodas” quanto ao seu desempenho, aproveitou esse momento para, uma vez mais, propagandear a sua longa experiência política e sobre o seu número de horas diárias de trabalho, e ainda para fazer publicidade ao seu “Roteiros VII”, remetendo os portugueses (quais?) para a leitura do prefácio (de 20 páginas!), onde o próprio disserta sobre qual deverá ser o comportamento de um chefe de Estado em tempos de crise, qual “manual de boas maneiras”! Ao contrário do que acontecera no “Roteiros VI”, onde Cavaco Silva foi crítico para com o então Primeiro-Ministro José Sócrates, nesta nova “sequela”, Passos Coelho foi poupado!
Não basta fazer breves e subtis comentários, em jeito de diagnóstico, como os que fez novamente no passado dia 15, para juntar aos muitos que por aí abundam. Aos portugueses pouco lhes dirá o que o Presidente da República discute com o Primeiro-Ministro nas suas reuniões semanais, ou sobre o seu périplo diplomático junto de chefes de Estado e de Governo ou de representantes de instituições internacionais, sem resultados palpáveis! Ainda que importante, tal não basta. Enquanto chefe de Estado, enquanto garante da soberania e da coesão nacional importa, sim, saber que medidas concretas pretende ou estará disposto a tomar, dentro das suas competências, para ajudar Portugal a sair do atoleiro em que se encontra. Como irá, por exemplo, o Presidente da República responder à teimosia e arrogância de Passos Coelho, que diz, à boca cheia, que não governa em função de manifestações, e que continuará com as suas políticas de austeridade, custe o que custar e para além do memorando da troika? Como irá ele (re)agir perante os resultados (esperados!) desta sétima avaliação da troika, que reflectem o estrondoso fracasso das políticas de Gaspar & Passos?
Lembremos que, por muito menos do que tudo aquilo que se está a passar, e sem contenção nas palavras a que agora se remete, Cavaco Silva tratou de preparar o terreno para despachar o governo do Eng. José Sócrates. Aqui, lembro que há dois anos atrás, precisamente no dia 9 de Março de 2011, Cavaco Silva incitava a sociedade civil, em particular os mais jovens, a indignarem-se e a fazerem ouvir a sua voz de protesto. Enquanto Cavaco Silva se vai fechando no seu silêncio, na sua inoperância, o som da Grândola irá certamente continuar a fazer-se ouvir em qualquer lugar, público ou privado, como maior ou menor fragor, desafinação, desalinhamento ou conhecimento da letra, seja sob a batuta do ministro Miguel Relvas, seja sob a de um outro maestro (jogral ou não) qualquer!
Desenganem-se aqueles que pensam que a democracia e o exercício da cidadania se ficam ou se devem circunscrever apenas ao voto popular. Desenganem-se os que pensam ser possível governar, com ou sem memorando de entendimento, contra um povo sacrificado, revoltado e sem perspectivas de futuro. É que já não é só da oposição que surgem críticas às políticas do governo de Passos Coelho. Elementos do próprio elenco governativo, dos partidos que o suportam, bem como de ilustres figuras do PSD e do CDS têm-se juntado ao coro de vozes que denunciam que a receita da austeridade falhou clara e inequivocamente, e que chegou o momento de se investir, de uma vez por todas, em políticas de crescimento e de emprego.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

O poder da ARTE


Encontra-se patente na Casa da Cultura de Vila Pouca de Aguiar uma exposição de pintura da minha autoria, até ao dia 11 de Março. Logo de seguida, a mesma seguirá para o Teatro de Vila Real, e depois para Chaves, aqui num espaço que ainda está por combinar. Mas o que realmente me traz por cá não é tanto o anúncio ou a publicidade, mas sim o leitmotiv que me levou à realização desses trabalhos.
No espaço de menos de um ano, esta é a terceira exposição que levo a cabo. Tudo começou nas férias da Páscoa do ano passado, quando decidi dedicar parte delas ao desenho e à pintura. No momento senti a necessidade de me abstrair da contemporaneidade, marcada por sucessivas notícias pouco estimulantes. Os tempos conturbados que atravessamos, em particular no nosso país, apesar de merecerem, no meu entender, um olhar crítico permanente, não podem tolher-nos os sentidos, nem a vontade de tirar partido dos melhores momentos que possamos construir e desfrutar. Assim penso, e assim aconteceu. Embriagado por uma música de fundo, decidi passar alguns dias completamente absorto pelas sensações proporcionadas pelo traço do lápis, e pela mancha sem destino, por vezes irreverente, deixada pelo pincel.
Por alguns bons momentos viajei, que nem um andarilho, pela poética e pela narrativa que a Arte, de forma grata e solidária, me fez glosar. Qual hermenêutica da linha e da cor! Tomei-lhe o gosto.
Há muito que não me dedicava com tal afinco e prazer no meu ainda precário ateliê. Digo “precário”, porque o meu espaço recôndito, destinado à criação, ainda não reúne o equipamento e o ambiente desejável para me sentir completamente integrado. Desta forma, um estímulo, o das artes plásticas, acabou por me levar a um outro, o da renovação do meu ateliê. Fica para curto/médio prazo. Entretanto, e sem narcisismos, vou libando deste agradável momento de ver as minhas obras expostas e dos comentários sinceros, sejam elogiosos ou não, de amigos e colegas.
Tenho na calha outros projectos, outras temáticas. Neste momento estou concentrado na linguagem e nas interpretações que a figura humana me pode proporcionar. No entanto, o próximo projecto, que se encontra no “segredo dos Deuses”, já está em marcha. Sem deixar de variar nos materiais e trabalhos plásticos a explorar, actualmente a minha preferência vai para a pintura. Depois, bem, depois logo se verá!

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Relatório do FMI: Nada mais do que a agenda ideológica do governo de Passos Coelho!

“A sua [do governo] ambição fundamental é a mercantilização integral da sociedade, num quadro em que a competição dispensa completamente a cooperação, e em que o mercado é afirmado e assumido como a única forma de organização social plenamente legítima. Nada mais conta!” (Manuel M. Carrilho)


Do muito que já se disse e escreveu acerca do famigerado relatório do FMI, divulgado no dia 9 de Janeiro, e que certamente terá novos capítulos, ficou bem claro que o mesmo resultou de uma encomenda feita pelo nosso governo. Isto foi, aliás, confirmado pelo próprio FMI, em declarações feitas à Rádio Renascença, no dia 16 do mesmo mês, quando admitiu ter-se baseado nos argumentos do governo português para a elaboração do relatório final, que, entre outras medidas, sugere cortes nos salários e nas pensões, e o aumento das taxas moderadoras e das propinas. Querer fazer passar uma encomenda, urdida por uma elite ultraliberal, por um estudo independente, tem tanto de ingenuidade como de perfídia! 
Depois de uma leitura crítica do dito relatório, as poucas dúvidas que tinha acerca das intenções “reformadoras” do governo cedo se dissiparam. Para mim, ficou translúcido que a tão apregoada “refundação do Estado”, mais não é do que a destruição do Estado Social. Iria mesmo mais longe: trata-se da destruição do próprio Estado, tal como uma sociedade democrática e progressista o concebe. Daí o anunciado (mas ainda não esclarecido!) corte de quatro mil milhões de euros nas suas funções.
Há já algum tempo que pouco ou nada nos tem surpreendido o governo de Passos Coelho. Tornou-se frequente virem a público os seus elementos, com o primeiro-ministro à cabeça, darem “o dito pelo não dito”! Basta lembrar muitas das promessas (quebradas!) que Passos Coelho fez na campanha eleitoral para as legislativas de 2011! O que hoje é verdade, amanhã é mentira, e vice-versa! Estamos perante uma espécie de ciclo vicioso, em que a táctica é a do princípio da negação, ou, como diria Manuel Carrilho, “é a táctica de avançar mascarado, jurando sempre respeitar o que se despreza, e rejeitar o que se venera. O resto são meros expedientes e pequenos truques, fáceis para quem gere o poder[1]. E um desses truques é o de, por exemplo, anunciar-se um “debate nacional” sobre a reforma do Estado, para logo depois se tornar num “debate privado”! E assim foi! Ao invés de estabelecer um diálogo sério, entenda-se, sem demagogias, nem manobras de diversão, com os parceiros sociais, partidos políticos, agentes das mais variadas entidades e instituições da sociedade civil, enfim, com a res publica, Passos Coelho optou por uma outra estratégia. Seleccionou um conjunto de figuras notáveis, escolhidas a dedo, e trancou-se com elas entre as paredes do Palácio Foz, promovendo um fórum, intitulado, "Pensar o Futuro - um Estado para a Sociedade", cujas conclusões foram entregues ao primeiro-ministro uma semana depois, também à porta fechada! Quer num caso, quer noutro, a comunicação social foi fortemente condicionada, ao ponto de ficar impedida de desenvolver o seu legítimo trabalho, ou seja, informar os portugueses. Eis o sentido de ética e de honestidade intelectual do nosso primeiro-ministro! Resumindo: o governo encomenda um relatório ao FMI, ao qual, e no mesmo momento, tem a ‘amabilidade’ de sugerir um guião com as linhas políticas/orientadoras que o próprio deseja (sequiosamente) ver implementadas; segue-se o anúncio do referido corte de quatro mil milhões de euros nas funções sociais do Estado (isto como quem atira barro à parede!); no seguimento, eis que surge um arauto acenando com a dita “refundação do Estado”; cerca de um mês depois é divulgado publicamente o dito relatório; gera-se e gere-se o pânico, e, por último, promete-se um “debate nacional”, mas não com quem e no espaço em que tal se impunha! Pois o que se tem visto, é que ao longo de todo este processo o governo tem demonstrado um total desprezo para com os seus principais parceiros sociais!
O primeiro-ministro tem razão quando veio a público dizer que o relatório do FMI não é a “bíblia do governo”. Certo! Na verdade, a bíblia de Passos Coelho, do governo e dos partidos que o apoiam é muito mais do que esse documento, por sinal cheio de grosseiros erros técnicos, tal como tem sido apontado por diversas figuras, quer das mais variadas cores partidárias (incluindo as do governo), quer de apartidários, quer do meio académico. A bíblia de Passos Coelho é, como sublinha Manuel Carrilho, “a de um ultraliberalismo estruturalmente fanático”, que tem passado despercebido a muitas almas! De modo simplificado, este ultraliberalismo materializa-se através da subjugação de todas as áreas e actividades da sociedade às leis de mercado, sejam aquelas de ordem social, política, cultural, educativa ou outra. É a política subjugada à economia. É esta a “refundação” idealizada por Passos Coelho. É esta a sua ‘bíblia’. Logo, os seus mandamentos estendem-se naturalmente a todas as áreas de governação.
No que respeita à Educação, as medidas propostas pelo governo para reduzir os encargos (e gulosamente apoiadas pelo FMI!) são de tal modo gravosas, que daqui só podemos esperar a aniquilação, por completo, da escola pública, e com ela o fim de uma educação democrática, plural e inclusiva. Aliás, logo no inicio do relatório, mais concretamente, no designado “Resumo Executivo”, esse cardápio está bem exposto[2].
De nada têm servido os pareceres e estudos feitos por organizações ou entidades altamente credenciadas, tal como a OCDE ou a Association for the Evaluation of Educational Achievemente, só para dar dois exemplos, que têm vindo a público certificar a qualidade e a excelência da escola pública. Aliás, esta última veio desmentir os dados avançados pelo relatório do FMI, no que respeita à Educação, tendo constatado um escamoteamento feito às conclusões de um grupo de trabalho do próprio Ministério da Educação e da Ciência (MEC), sobre os custos de um aluno do ensino público vs privado. Ao contrário do propagandeado pelo governo (com o apoio de alguma comunicação social!) esse grupo de trabalho concluiu que a despesa de um aluno no privado é maior do que no público! Por cá, o governo de Passos Coelho, e o ministro da Educação em particular, têm feito (convenientemente) tabula rasa de estudos académicos[3], dos pareceres do Conselho Nacional de Educação, assim como, imaginem só, dos dados recolhidos pelo próprio MEC relativos à Avaliação Externa das Escolas! O objectivo é claro: destruir a escola pública para servir interesses privados. Para tal, o governo tem-se apressado em implementar um conjunto de medidas, que têm como resultado mais imediato, o despedimento de dezenas de milhares de professores. Falamos de cortes orçamentais cegos na Educação, do aumento do número de alunos por turma, do aumento da carga lectiva, da descaracterização do currículo ou então dessa irracionalidade, dessa aberração que representa a criação dos chamados mega-agrupamentos. Sobre estes, e por enquanto, tenho apenas a dizer que do processo obscuro e atabalhoado de que têm resultado, ao menos que resulte na manutenção das direcções de escolas competentes e na extinção das que não o são!



[1] CARRILHO, Manuel Mª (2013). A Bíblia de Passos. Diário de Notícias, 18 de Janeiro de 2013.
[2] IMF (2013). Portugal: Rethinking The State - Selected Expenditure Reform Options. January.
[3] Um estudo da Universidade Porto, que analisou o percurso académico de 4280 estudantes admitidos no ano lectivo 2008/09, conclui que as escolas públicas preparam melhor os alunos para terem sucesso no ensino superior.