segunda-feira, 25 de maio de 2009
















Educação Patrimonial

O património, tal como o nome indica, representa um legado herdado dos nossos pais e antepassados. Trata-se de uma herança que, pela sua riqueza e diversidade, representa a memória, a identidade e a cultura de um povo.
O património cultural não se restringe a um conjunto de artefactos históricos ou artísticos, ou a monumentos e espaços de importância histórica. Nele incluem-se, efectivamente, todo um conjunto de manifestações artísticas, culturais e populares, que representam uma cultura viva, e que se pode apresentar através de diversas formas de expressão cultural, tais como: a música, as danças, a literatura, as histórias e lendas, as festas populares, o folclore, a gastronomia, as relações sociais e familiares, etc. No entanto, todo este repertório só fará sentido, ou melhor, só poderá ser legado às próximas gerações, se formos capazes de lhe reconhecer a riqueza e o valor que representa para a humanidade.
A preservação, o estudo e a divulgação do nosso património são vitais para garantir a nossa identidade e os seus valores intrínsecos. Como já o afirmámos noutra obra, “o património é um capital cultural que desafia a assunção de actividades no âmbito do seu conhecimento, da sua compreensão e da sua preservação” (Barbosa; Teixeira & Duarte, 2001: 17). O conhecimento do nosso património e da nossa cultura é condição sine qua non para a edificação de uma consciência crítica e activa, bem como para o desenvolvimento da própria cidadania. Esta é, aliás, uma posição que se inscreve no pensamento de Mª de Lourdes Horta (2003: 6): “O conhecimento crítico e a apropriação consciente por parte dos consumidores e indivíduos do seu «património» são factores indispensáveis no processo de preservação sustentável desses bens, assim como no fortalecimento dos sentidos de identidade e cidadania”.
A preservação do património cultural constitui o garante do direito à memória individual e colectiva, sendo, por isso, um princípio básico do exercício da cidadania. Como já o atestámos: “Configurando-se como direito a usufruir por indivíduos e colectividades, o património implica um conjunto de deveres de cidadania. O conhecer, o cuidar e o preservar são alguns desses deveres – eventualmente indutores de outras obrigações e de outros comportamentos cívicos” (Barbosa; Teixeira & Duarte, 2001: 16).
Philippe Guglielmi (1999) entende haver uma complementaridade entre o conceito de património e o de cidadania. Este autor parte de uma definição alargada de património, que traz em si subjacente a de cidadania. Deste modo, define património como sendo “uma soma de referências artísticas, históricas e antropológicas, testemunhos da actividade humana e de cunho humanizado sobre a nossa terra”, dizendo ainda tratar-se da “leitura de uma sedimentação de sinais da paisagem e nas formas habitadas, nas línguas e na cultura, nos objectos […]”, à qual se junta, ainda, de acordo com os tempos hodiernos, “a necessária perpetuação da memória, que é também uma reconstrução de sentidos sobre novos suportes de imagens” (Guglielmi, 1999: 63-64).
Encontramos na Educação Patrimonial o processo desejável para a abordagem do património cultural, enquanto instrumento que sirva para despertar uma consciência crítica, o comprometimento para com a sua preservação e, em consequência, a afirmação da cidadania. Caminhamos, deste modo, para um processo que se inicia através daquilo a que Paulo Freire designava de «alfabetização cultural», que desenvolva no educando a capacidade de compreensão da sua identidade cultural e a reconhecer-se, de forma consciente, nos seus valores, na sua memória pessoal e colectiva (Cf. Freire, 2003: 81). Em síntese, trata-se de desenvolver no indivíduo a capacidade de leitura e compreensão do universo sociocultural em que se insere.
Assim, a escola deverá garantir as condições indispensáveis para que os alunos se envolvam directamente em acções de preservação cultural, que por sua vez os levem, através de um processo contínuo de descoberta, a aproximarem-se, a conhecerem, a valorizarem e a apropriarem-se de uma herança cultural que lhes pertence. Desta forma, estariam lançadas as bases para que pudessem desenvolver e adoptar uma posição crítica e activa na construção da sua identidade e cidadania. Contudo, tenhamos presente que uma iniciativa com esta responsabilidade necessita da colaboração e participação da comunidade para obter os melhores resultados. Uma educação patrimonial deve, por isso, ultrapassar os muros da escola e envolver outras entidades e instituições, locais e regionais, tais como: museus, bibliotecas, arquivos, empresas, institutos, autarquias, associações recreativas e culturais, centros culturais, entre outras.


BARBOSA, Manuel; TEIXEIRA, Luís & DUARTE, Rui (2001). Educar para a cidadania através da arte e do património: um projecto de investigação-acção com alunos da Escola E.B. 2 e 3 de Vila Pouca de Aguiar. Braga: CEEP/Instituto de Educação e Psicologia - Universidade do Minho.

FREIRE, Paulo (2003). Acção Cultural para a Liberdade e outros escritos. 10ª Edição. São Paulo: Paz e Terra.

GUGLIELMI, Philippe (1999). “Liens entre patrimoine et citoyenneté”. In Guichard, Gwenaëlle (coord.). Patrimoine et citoyenneté. Paris: Édition du Club France Loisirs, pp. 63-64.

HORTA, Mª de Lourdes (2003). Guia Básico de Educação Patrimonial. Brasília: Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional / Museu Imperial.