terça-feira, 19 de julho de 2022

Sobre a estupidez humana

«O problema do mundo é que os estúpidos são
presunçosos e os inteligentes são cheio de dúvidas.» 
Bertrand Russell

Em 1976 Carlo M. Cipolla publicava um pequeno livro, curiosamente não na sua língua materna, o italiano, mas sim em inglês, a que daria o título de “As leis fundamentais da estupidez humana”. Só em 1988 é que este ensaio seria publicado na língua do autor, juntamente com um outro, de 1973, que resultaria num volume intitulado Allegro ma non troppo (“Alegre, mas não muito”). Como é dito no prefácio do primeiro título, escrito por Nassim Nicholas Talleb (edição de 2021, Editora Cultura), o que parecia tratar-se de uma sátira, era na realidade um trabalho académico sério sobre análise económica. De registar que o autor foi professor de História Económica, tendo leccionado em várias universidades.
Segundo Cipolla são 5 as leis fundamentais da estupidez humana, a saber:
1ª – Inevitavelmente, toda a gente subestima sempre o número de indivíduos estúpidos em circulação.
2ª – A probabilidade de uma certa pessoa ser estúpida é independente de qualquer outra característica dessa pessoa.
3ª – Uma pessoa estúpida é aquela que causa perdas a outra pessoa ou grupo de pessoas, enquanto ela própria não retira nenhum ganho da acção e pode até incorrer em perdas.
4ª – As pessoas não-estúpidas subestimam sempre o poder destrutivo dos indivíduos estúpidos.
5ª – Uma pessoa estúpida é o tipo mais perigoso de pessoa que existe.
No seu livro, para cada uma destas leis o autor dá vários exemplos que acorrem no dia-a-dia de qualquer pessoa, deixando inclusive algumas sugestões para o indivíduo se proteger da estupidez humana. Quer da sua, quer da dos outros.
Entretanto, gostaria de destacar 3 das 5 leis da lista. Começo pela segunda, pela simples razão do pasmo que poderá (ou não) causar. Para Cipolla, ser-se estúpido é algo determinado pela natureza e não por forças ou factores culturais, e sustenta-o da seguinte forma: “É-se estúpido da mesma forma que se é ruivo; pertence-se ao conjunto dos estúpidos da mesma forma que se pertence a um grupo sanguíneo. Um homem estúpido nasce como homem estúpido por determinação da Divina Providência.” À parte a ironia, visto por este prisma parece-me que a estupidez acaba por ser uma fatalidade para muita gente! Passando à terceira lei, Cipolla define ‘estúpido’ como alguém que prejudica os outros sem obter qualquer ganho para si próprio. De facto, o qualificativo parece assentar que nem uma luva. Sobre a quarta lei, o autor chama a atenção para as consequências de subestimar os estúpidos. Neste caso, o mesmo adverte para o seguinte: “Podemos ter a esperança de conseguir ultrapassar as maquinações dos estúpidos e, até certo ponto, poderemos mesmo consegui-lo. Porém, devido ao seu comportamento errático, não podemos prever todas as acções e reacções dos estúpidos e, em breve, seremos pulverizados por jogadas imprevisíveis do parceiro estúpido.”
Para ajudar a compreender e a defendermo-nos da estupidez humana, presente em inúmeros contextos do nosso cotidiano, Cipolla criou um modelo de análise, traduzido no gráfico a seguir apresentado. Neste gráfico o comportamento das pessoas é dividido em 4 categorias: Inteligentes; Bandidos; Desamparados e Estúpidos. Como se vê, os estúpidos ocupam a parte inferior esquerda do gráfico, por oposição aos inteligentes, que ocupam a parte superior direita do mesmo.




A forma como em cada um dos 4 espaços as relações sociais se desenvolvem, com ganhos ou perdas individuais ou colectivas, é ilustrada no livro com vários exemplos, que não vou agora e aqui elencar. O livro, além das suas reduzidas dimensões (11x17cm), tem apenas cerca de cinco dezenas de páginas para ler, numa linguagem muito clara. Vale a pena ler esta preciosa obra. Quanto mais não seja para nos precavermos da estupidez!