segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Sobre a colocação de professores

A falta de docentes continua a atormentar muitas escolas. Cronicamente milhares de alunos vêem-se sem professor, não só pela escassez destes profissionais nalgumas disciplinas, mas também por alguns deles se recusarem a leccionar longe da sua residência, por não poderem suportar as despesas de deslocação ou a renda de uma segunda habitação. Uma decisão legítima. A formação de novos professores é aquilo que se sabe. Muitas das universidades e politécnicos não chegam a abrir cursos por falta de candidatos, e outros há que se iniciam com apenas um punhado deles.
A colocação de professores é feita respeitando uma lista nacional de graduação, ou seja, são primeiro colocados nas escolas, aqueles que têm mais tempo de serviço, logo, os que têm mais experiência de ensino. O Ministério da Educação prepara-se para dar às direcções das escolas a possibilidade de contratarem um terço dos seus docentes. Aquilo que, à partida, poderia ser uma solução para colmatar algumas falhas, acaba por levantar dúvidas quanto à forma como tal processo de recrutamento se venha a realizar. Os sindicatos de professores questionam igualmente a seriedade e isenção de alguns directores no momento desse recrutamento. Receiam que este seja condicionado àquilo que designam de “amiguismo”. Ainda que não se saiba ao certo a forma como venha a decorrer, certo é que é justificada essa desconfiança.
Sobre este tema, o ministro da educação, João Costa, noticiado por vários órgãos de imprensa, referiu o seguinte: "Eu não gosto de partir do princípio que os meus interlocutores são todos corruptos e tenho respeito pelos professores, os directores também são professores, e obviamente será possível desenhar modelos de recrutamento, mesmo quando houver contratação mais local que previne coisas desse tipo. Fazer imputação de suspeitas de corrupção a directores é desvalorizar professores". Em síntese, João Costa refuta a ideia de que os directores são todos desonestos. Esta forma cândida de abordar o assunto, e até com um certo grau de cinismo, pretende lançar uma cortina de fumo para cima de alguns problemas que afectam os professores, em particular os entraves na progressão na sua carreira.
Quando os sindicatos falam em “amiguismo”, sabem bem o que os motiva a utilizar este termo. Também estes não consideram que todos os directores de escola são desonestos, mas é bem conhecida a forma obscura como alguns deles decidem a atribuição da nota da avaliação dos professores no final de cada ciclo avaliativo, em especial no momento da ascensão a escalões sujeitos a quotas. Quem está por dentro sabe que nem sempre os professores mais empenhados, mais dedicados, enfim, mais profissionais, são aqueles a quem lhes são atribuídas as merecidas menções de “Muito Bom” ou “Excelente”. Quantas vezes, estas são reservadas aos aduladores ou àqueles com quem o director tem favores a saldar. Sobre este tema já tive a oportunidade de me debruçar num artigo aqui publicado, no mês de Abril deste ano, e que intitulei de “Educação, as pedras no sapato”. Entre outros males que afectam o sistema educativo português, lembrava precisamente nesse texto o problema da avaliação de desempenho dos professores e do estrangulamento das suas carreiras, não só pelo injusto sistema de quotas para ascender a certos escalões, mas pela forma insidiosa como nalguns casos eram atribuídas as classificações finais.
Ao JN, a 22 de Setembro, Pedro Barreiros, dirigente da Federação Nacional da Educação, lembrava o seguinte: "Sabemos o país em que vivemos, as histórias que nos contam e o que se passa em concreto nas escolas". (…) E sabemos os processos judiciais que temos relacionados com amiguismo e com factores ditos C [cunha]. As coisas têm de ser ditas como elas são", reforçou. O dirigente sindical receia, pois, que o novo modelo de contratação de professores venha a sofrer do mesmo mal que já se verifica na avaliação de desempenho docente.
Não haverá modelos de colocação de professores perfeitos, e certamente o actual não o será, mas aquele que o Ministério da Educação pretende adoptar levanta várias reservas, nem eventualmente será o melhor para solucionar o problema da falta de professores.