domingo, 5 de julho de 2015

O Supremo Tribunal de Exames


Estamos à porta da segunda fase dos exames nacionais. As escolas continuam na azáfama de preparar as condições necessárias para que essas provas decorram com toda a normalidade, seguindo uma panóplia de procedimentos e critérios burocráticos e rigorosos.
No anterior artigo debrucei-me sobre os efeitos perversos que a avaliação externa (entenda-se, os exames nacionais) tem provocado no processo de ensino-aprendizagem, na medida em que, como dissera, “o trabalho docente passou a privilegiar a preparação para os exames, em detrimento de uma escola que promova a curiosidade, desenvolva a inteligência e fomente a criatividade”. Desta vez focar-me-ei nos exames do ensino secundário, pela sua maior visibilidade, não só porque é o patamar que antecede o ensino superior, mas sobretudo por ser o leitmotiv do trabalho lectivo de muitos docentes.
Na dupla qualidade de professor e encarregado de educação vou ouvindo alguns dos meus caros colegas dizerem esta coisa assombrosa e peregrina, de que o seu trabalho lectivo visa, grosso modo, a preparação para os exames. Portanto, a sua grande e nobre missão é aprontar os alunos para levá-los a “julgamento” no Supremo Tribunal de Exames, um momento de avaliação que se debruça apenas, sublinho, sobre uma parte de um conjunto mais alargado de aprendizagens trabalhadas durante o ensino secundário, nos mais diversos domínios.
Ao contrário de outros países que levam a sério a educação, e que por isso figuram no top mundial dos melhores sistemas de ensino do mundo, no nosso país, o acesso ao ensino superior tem como critério único os exames nacionais. Nalguns deles, as capacidades artísticas, desportivas, actividades extracurriculares, entre outros, são valorizados e tidos em conta no ingresso no ensino superior. Como se não bastasse, por cá, a percentagem que algumas disciplinas atribuem ao domínio dos valores e atitudes, na avaliação dos seus alunos, é mísera, desvalorizando, assim, uma componente fundamental para a formação cidadã dos jovens.
Na minha opinião, essa é uma visão muito estreita e limitada do que deveria ser a realidade educativa. Vejamos, os exames nacionais valem apenas 30% da avaliação final! Depois, um aluno, por muito bem preparado que esteja não está livre de ter um dia não, de ter um bloqueio na hora do exame e deitar algo a perder no conjunto da sua avaliação final. Além disso, a tão propagandeada exigência colocada nos exames fica na gaveta em anos de eleições. É ao que estamos a assistir actualmente, com professores e alunos a considerarem os exames deste ano bastante acessíveis. Compreende-se, convém que as estatísticas sejam favoráveis e que o ministro da educação e o governo fiquem bem na fotografia!
O trabalho lectivo e pedagógico deveria, sim, estar centrado nas aprendizagens que se vão realizando, dia-a-dia, em diferentes contextos educativos, numa prática pedagógica reflexiva que, e ao primeiro sinal, procure dar resposta às dificuldades manifestadas pelos alunos. Em vez de despejar matéria de forma desgarrada para “cumprir o programa”, porque dizem, “há um exame!”, nem que tal signifique deixar para trás alguns alunos, haveria, sim, que prepará-los para os diferentes momentos de testagem dos mais variados conhecimentos e competências, através dos diferentes instrumentos de recolha de dados (testes sumativos, relatórios, trabalhos escritos, apresentações orais, entre muitos outros). Esse é o princípio basilar da avaliação contínua e formativa, integrada numa perspectiva de educação holística. 

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